Espaço para o debate

Incentivar as manifestações culturais é um compromisso do Sistema
Fecomércio Sesc Senac PR
Um movimento artístico que resiste e abre espaço para diálogos, reflexões, debates e vivências. Assim pode ser definido o maior projeto de circulação e difusão de artes cênicas do país, o Palco Giratório. Uma das tônicas de sua programação está em criar amplamente esses lugares de fala e propagar trabalhos cujos temas estão centrados justamente em grupos subalternizados e minoritários.

Com curadoria do Sesc Nacional, o projeto desembarcou no Paraná no mês de agosto e, até novembro, percorrerá oito cidades do estado. “Teremos uma boa representatividade, pois dos 20 grupos que compõem a circulação nacional, 11 passam pelo Paraná, com linguagens cênicas muito diversas”, pontua o analista de Cultura do Sesc PR, Cléber Pereira Borges.

Jacarezinho, Curitiba, Ponta Grossa, Londrina, São José dos Pinhais, Campo Mourão, Medianeira e Paranavaí recebem espetáculos de teatro, dança e circo da edição 2019 do Palco Giratório, somando 24 apresentações, parte delas gratuitas. Além dos espetáculos, ações formativas serão realizadas em quatro cidades, totalizando 102 horas.

Teatro de Papel
De acordo com Borges, o Palco Giratório 2019 convida o público a vivências e experimentações
Espetáculo Vestido Queimado, de Manaus (AM)
que, muitas vezes, fogem do teatro convencional. A exemplo da narrativa fantasiosa sobre a amizade,
toda feita em papel da Soufflé de Bodó Company, de Manaus (AM), no espetáculo Vestido Queimado
em Curitiba, no Teatro do Sesc da Esquina, e também no Sesc Cadeião Cultural, em Londrina.

“O Palco Giratório tem esse papel de mostrar um panorama do que é produzido no Brasil no campo
Bate-papo após a apresentação da peça Vestido Queimado, de Manaus (AM)
das artes cênicas. Essa diversidade de produções artísticas é o grande ganho do projeto, como o caso do teatro de papel, linguagem cênica pouco difundida no país”, observa.

Segundo o diretor, Francis Madson, esse é o primeiro espetáculo de teatro manauara que integra o projeto do Sesc Nacional. “Ele surgiu entre 2013 e 2014, no programa Sesc Residência, do Amazonas, e foi todo montado em
quatro meses, além de ter sido custeado por esse edital. Para nós é uma alegria estar nesse espaço,
pois até o fim do ano vamos somar mais de 30 apresentações em 17 estados brasileiros”, pontua.

Na plateia de Curitiba, destaque para artistas em formação do curso Técnico em Teatro do Colégio
Estadual do Paraná, acompanhados por professores. “O projeto do Sesc tem esse papel onde os Brasis
circulam e se encontram. É uma experiência única assistir cada espetáculo”, comenta a professora,
Silvia Conturci.

A peça Mulher Arrastada mistura narrativa ficcional à trágica história de Cláudia Silva Ferreira
Manifesto
“Cláudia Silva Ferreira, presente”, é com essa fala que o espetáculo A mulher arrastada, tem sido
encerrado em todos os lugares por onde passou. Em Curitiba não foi diferente. A peça-manifesto foi
escolhida como estreia do Palco Giratório na capital paranaense. Com dramaturgia assinada por Diones Camargo, de Porto Alegre (RS), o espetáculo encenado no Teatro do Sesc da Esquina teve
sessão extra, devido a limitações de espaço, pois tanto os atores como o público dividiram o palco.

Após a apresentação, o dramaturgo e o elenco formado pelos atores Celina Alcântara e Pedro Nambuco, reuniram-se com o público para um bate-papo sobre a motivação cênica. A mulher arrastada mistura uma narrativa ficcional com referências à trágica história  e Cláudia Silva Ferreira, mulher negra, pobre, 38 anos, mãe de quatro filhos biológicos e outros quatro adotivos, brutalmente alvejada pela Polícia Militar ao sair de casa no Morro da Congonha, no Rio de Janeiro, para comprar pão para a família.

No bate-papo proposto pelo grupo, a atriz Celina Alcântara enfatizou a oportunidade de levar o
espetáculo a várias regiões brasileiras, por meio do Palco Giratório. “Só temos a agradecer ao Sesc em Curitiba e ao Nacional por conseguir levar esse trabalho para o país. Já estivemos no Norte,  saímos de São Paulo e viemos para cá, ou seja, estamos numa gira bem grande levando essa história e essa reflexão por todos os cantos. Nada mais radical e político, no momento atual, do que isso: poder fazer a defesa da arte e da educação no país. E o Sesc tem feito esse papel de valorização da cultura muito bem”, observou.

A Companhia Gumboot Dance Brasil, no espetáculo de dança Subterrâneo
Resistência
Eduardo Galeano, em O Livro dos Abraços, afirma que “quando é verdadeira, quando nasce da  necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas
mãos, ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for”. É sobre a necessidade dizer, de expressar e de resistir que depois de dois anos e meio de pesquisa nasceu o espetáculo de dança Subterrâneo, com
Companhia Gumboot Dance Brasil
o grupo Gumboot Dance Brasil, de São Paulo (SP), apresentado no Teatro do Sesc da Esquina, em
agosto.

O espetáculo faz referência ao intenso garimpo de ouro e de diamante nas minas na África do Sul,
Companhia Gumboot Dance Brasil
no fim do século XIX. Diferente da escravidão do negro em terras brasileiras, lá o sistema de exploração foi por meio do recrutamento de homens de todo o continente africano para subempregos e para o árduo trabalho subterrâneo de mineração. Oriundos de diferentes tribos, regiões e de uma infinidade de línguas e de dialetos, a comunicação por um único idioma, compreensível a todos era praticamente impossível. As batidas nas botas – itens da roupa de trabalho –, tornaram-se um código o Gumboot, para informar sobre perigos, o tempo, a esperança. “Essa energia coletiva era necessária
para a sobrevivência. Quando perceberam que juntos poderiam lutar por melhores condições de trabalho, iam em grandes grupos para a frente da casa dos donos das minas e dançavam o Gumboot. Eles sabiam que juntos, batendo nas botas, estavam falando a mesma coisa”, enfatiza o bailarino, coreógrafo e especialista em dança Sul Africana, Rubens Oliveira.

Após a apresentação, os 11 dançarinos e músicos participaram de um bate-papo com a plateia sobre
o Palco Giratório, que leva artistas e espetáculos por todo o país. “O projeto nos dá oportunidade
de nos apresentarmos por muitas cidades e estados do Brasil. O Sesc tem nos proporcionado espaços
onde confortavelmente podemos fazer e falar sobre a nossa arte. Pelo trabalho do Sesc que tem os
visto em todo o território nacional podemos dizer que essa instituição é o Ministério da Cultura do
nosso país”, declara Oliveira.

Por mais de uma hora, a plateia conversou, compartilhou e questionou sobre dança, opressão, racismo, resistência, periferia, violência e sobrevivência e dores coletivas. “Porque todos, todos, temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou
perdoada”, escreveu Galeano.

O Palco Giratório retorna ao Paraná em outubro e novembro. Mais sobre a programação pelo site www.sescpr.com.br/palcogiratorio.


Texto: Isabela Mattiolli e Silvia Bocchese de Lima
Fotos: Bruno Tadashi e Ivo Lima
Revista Fecomércio PR - nº 131

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