Sonoros Ofícios

O Sesc realiza há 18 edições, o Sonora Brasil – maior projeto de circulação musical do país – e, em 2016, traz às regiões Sul e Sudeste quatro grupos para as apresentações de Sonoros Ofícios – Cantos de Trabalho


Destaladeiras de Fumo de Arapiraca e Mestre Nelson Rosa
O trabalho árduo começa logo nas primeiras horas de sol, prolonga-se durante todo o dia e adentra à noite. São meses de dedicação ao plantio, rega, limpeza do canteiro, manejo, preparo dos varais para secagem das folhas de fumo até que elas estejam prontas para o destalo. Para amenizar as agruras nas lavouras de fumo, tradicionais na cidade de Arapiraca-AL, o canto ainda faz parte da rotina laboral. “A atividade é braçal e as pessoas contavam que o trabalho cantado é mais alegre e a plantação fica mais bonita. Nas lavouras de subsistência, os trabalhadores fazem seu trabalho entoando canções. Na cidade que foi celeiro da cultura do fumo, Arapiraca, os agricultores trabalhavam cantando, desde o plantio até os salões de destalação”, revela Nelson Rosa, mestre de coco de roda e reconhecido como patrimônio vivo do estado de Alagoas.

Os cantos são de composições coletivas, entoados em versos quadras e sextilhas e Regineide Rosa dos Santos, integrante do grupo Destaladeiras de Fumo de Arapiraca, revela que os cantos fazem com que o tempo passe mais rápido. “Este é um trabalho muito cansativo, dias e noites sentados no chão fazendo esta rotina, cantamos versos tirados ali, no improviso, com assuntos corriqueiros, da natureza e de namoricos, tudo isso para amenizar o cansaço”, enfatiza.

Ao lado do grupo Destaladeiras de Fumo de Arapiraca, Mestre Rosa está rodando o Brasil desde 2015, com o projeto do Sesc, o Sonora Brasil, que traz os Cantos de Trabalho como tema central. No ano passado, o grupo fez apresentações nos estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste e, em 2016, visitam o Sul e Sudoeste. “Com meus 82 anos, estou vivendo uma experiência única, com o Sesc me levando por este Brasil afora. Em 2015 foram 64 apresentações, quase dois meses ausentes de casa, mas é gratificante saber que por esta ação e por este projeto o Paraná está conhecendo a nossa cultura. Dificilmente isso aconteceria por iniciativa de um órgão governamental”, acredita Mestre Rosa.

Trabalhando por muitos anos na lida do gado, transportando boiadas pelos campos do semiárido baiano, Ailton Aboiador também virá ao Paraná, em novembro. Como companheira de descanso da lida, as toadas. “Eu lhe falo sincero, que a cultura do vaqueiro já estava morta, mas com o Sonora eu
estou achando que a cultura reviveu. Me deu uma vontade de começar agora a vida de vaqueiro, essa profissão que é a minha paixão... Eu já tive vários acidentes a cavalo, tenho diversas marcas no corpo feitas com ponta de boi e ponta de pau. Antes de ontem cheguei a sonhar que estava correndo atrás de boi, no mato. É uma coisa que eu não consigo me afastar. Ao Sesc eu dou meus parabéns, dou nota 1.000, porque foi o único órgão que eu vi resgatar a cultura que para mim estava morta há muitos anos. É um grande orgulho integrar este circuito e só assim eu vou terminar de matar as minhas paixões de falar da vida de vaqueiro”, testemunha Ailton Aboiador, de Valente-BA, que junto às Cantadeiras do Sisal e Aboiadores de Valente participará do Sonora Brasil.

Cantos de Trabalho
É recorrente em pesquisas sobre a música o tema cantos de trabalho e a proposta do Sesc é apresentar um panorama dessa expressão, no palco. Para isso, foram selecionados quatro grupos. “Três desses grupos são de fato de tradição, como as Destaladeiras de Fumo de Arapiraca e Mestre Nelson Rosa; as Quebradeiras de Coco Babaçu e as Cantadeiras do Sisal e Aboiadores de Valente. Cada um deles traz algo em comum, que é um repertório utilizado na lida diária, mas cada um com sua característica
particular. São músicas com cunho político, conquista de direitos, ligadas à atividade laboral. Os cantos de trabalho estão muito ligados a essas questões do cotidiano e aos lamentos e queixas. Já Ilumiara não é um grupo de tradição, é formado por músicos e pesquisadores”, explica o assessor técnico de Música do Departamento Nacional do Sesc, Gilberto Figueiredo.


Texto: Silvia Bocchese de Lima
Fotos: Ivo José de Lima

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Black Friday digital

Em reverência a Poty

Poty por aqui