É o fim do caminho


 Há 12 anos, a Polícia Federal fechou a Estrada do Colono. Com o uso de tratores destruiu o leito da estrada e, a balsa que fazia a travessia de veículos e da população foi dinamitada. O sonho da reabertura deste caminho permanece vivo
 
Iria e Anildo Theisen, moradores de Porto Lupion
Quando os fogos de artifício, cornetas, surdos e timbaus celebram o Sete de Setembro do outro lado do Rio Iguaçu, a melancolia toma conta do casal Iria e Anildo Theisen, moradores de Porto Lupion, região de Capanema, Sudoeste do Paraná. A tristeza dos dois tem um motivo: há mais de uma década a estrada de 17,5 quilômetros que ligava Capanema a Serranópolis do Iguaçu foi fechada e, desde então, os Theisen e outras milhares de pessoas, colonos ou não, aguardam esperançosos pela reabertura do Caminho do Colono.
Antigos proprietários de uma lanchonete que funcionou até 2001, os Theisen contam que a localidade morreu com o fechamento da estrada - que julgam arbitrário. “Se vem visita aqui, a gente conversa. Se não vem, a gente nem tem mais o que conversar, fica se olhando e acaba indo ao cemitério que virou a distração do lugar”, revela o morador.


Ação policial durante o fechamento da estrada, em 2001
(Acervo da Prefeitura de Serranópolis do Iguaçu)
Do alto da estrada era possível avistar o rio e os motoristas sabiam que se a balsa estivesse do lado oposto, poderiam ir calmamente até a beira do Iguaçu. “Mas quando eles não viam a balsa, era aviso que precisavam se apressar. Os carros vinham buzinando, dando sinal de luz para que o balseiro esperasse por mais um veículo”, conta Theisen. Alguns motoristas, guiados por GPS desatualizados ainda chegam a Porto Lupion na esperança de cruzar o rio. Mas a travessia não é possível desde o dia 13 de junho de 2001, quando a balsa foi dinamitada dentro do rio, pela Polícia Federal. O professor Dr. Antonio Marcos Myskiw, da Universidade Federal da Fronteira Sul, conta que 300 agentes federais procederam o fechamento da estrada, cumprindo uma determinação do Supremo Tribunal Federal, utilizando seis ônibus, oito viaturas, dois helicópteros e duas lanchas – uma afronta para os moradores da região. O primeiro fechamento da estrada ocorreu em 1986 e um ano depois, foi reaberta de maneira ilegal. “Em 2001, o leito da estrada foi destruído mediante uso de tratores. A balsa foi dinamitada e afundada no Rio Iguaçu. Ocorreram violência, lesões corporais e prisões de colonos e de lideranças políticas e militares”, destaca o professor.

Seu Elói, morador de Porto Lupion
Hoje a área é considerada intangível, não sendo permitida a travessia por barco, a pé, nem por veículos. Bem diferente do que acontece do lado argentino: a Ruta Nacional 101 cruza 42 quilômetros do mesmo parque. Tristeza para o Seu Elói, que não mais pode pescar e utilizar o pequeno barco, abandonado na área inferior de casa. A ele resta, no fim da tarde, olhar saudoso para o rio, na esperança que um dia o caminho volte a ser reaberto.

Para a secretária de Educação, Cultura e Esporte de Serranópolis do Iguaçu, Maria Madalena Bertolini, o Caminho do Colono foi a principal porta para a colonização dos municípios das duas regiões.  A antiga estrada é anterior à criação da maioria dos municípios das regiões Oeste e Sudoeste paranaenses. Datada do início do século XX, foi caminho indígena e utilizada como passagem pelos revoltosos da Coluna Prestes, na década de 1920.

Antiga Estrada do Colono
(Acervo da Prefeitura de Serranópolis do Iguaçu)
Por este caminho passaram, em caminhões e carroças, mudanças de colonizadores gaúchos e catarinenses que se instalaram no Paraná e em terras do Centro-Oeste. O ex-prefeito de Capanema, Egon Paulo Grams, conta que em 1969 a praça da cidade era local de parada de migrantes vindos do Sul do Brasil. “Em épocas de cheia do rio, a balsa não fazia o transporte e era necessário esperar até oito dias para que as águas baixassem. A praça se tornava um grande acampamento, com famílias, mudanças e animais. Chegavam a passar até 40 mudanças por dia para desbravar estas regiões”, lembra Grams.

Fim da estrada, em Porto Lupion. Antigo acesso
à balsa que fazia a travessia do Rio Iguaçu



A largura da Estrada do Colono não era maior do que 12 metros e pela terra batida passavam 22 linhas de ônibus diariamente. Em dias de sol forte uma vermelha nuvem de poeira era costumeira, assim como os atoleiros em dias de chuvarada. Todo este tráfego de pessoas e veículos movimentava a meia dúzia de estabelecimentos comerciais que se formou à beira do rio, em Porto Lupion e em Serranópolis do Iguaçu. Nenhum deles sobreviveu ao fechamento da estrada.

A expectativa dos moradores é alimentada pelo projeto de Lei n° 7.123/2010, que já foi aprovado pela Câmara dos Deputados e enviado ao Senado Federal, que institui a Estrada-Parque Caminho do Colono no Parque Nacional do Iguaçu. Com este projeto, pretende-se estabelecer regras para a circulação de veículos e pessoas, sem tráfego à noite, com a utilização de redutores de velocidade ao longo de todo o percurso, sinalização específica, guaritas para controle, pagamento de pedágio, policiamento e fiscalização de todos os veículos, além de facilitadores para a passagem de animais. “Sem a estrada, ficamos em um canto do mapa, numa rua sem saída, no fim do caminho. Posso até morrer, mas a esperança que esta estrada seja reaberta não morrerá jamais”, desabafa Theisen.


 Texto e fotos: Silvia Bocchese de Lima
Revista Fecomércio PR - nº 96



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