Charmoso Johnscher

Hotel Johnscher, em Curitiba


Inaugurado em 1917, Hotel Johnscher guarda o charme das primeiras décadas do século XX aliando conforto, hospitalidade e cultura


Foi nas páginas do Diário da Tarde, de 14 de julho de 1917, que a viúva Victoria Johnscher fez um comunicado ao público curitibano, informando aos senhores passageiros, imigrantes e excelentíssimas famílias que um novo estabelecimento de hospedagem estava sendo inaugurado na cidade. “Communico que abri á Rua Barão do Rio Branco n. 55 (em frente ao Palácio do Governo), um importante Hotel sob a denominação de Hotel Johnscher”. A nota ainda dizia que no local os hóspedes encontrariam conforto durante a estada. “Quartos bem arejados, Banheiros de 1ª ordem, obedientes aos mais rigorosos preceitos da hygiene, optima cosinha e espaçosas Salas de visitas. Todos os dias, especialmente aos sabbados e domingos, temos um variado menu”. 


Anúncio publicado no Jornal Diário da Tarde
Acervo da Hemerotena Digital da Biblioteca Nacional


O anúncio público era para marcar e deixar claro que o espaço estava sob nova gerência, bem diferente das anteriores, que carregavam o estigma de ser frequentado por homens de negócios ou viajantes, que ao invés das esposas, traziam suas acompanhantes, além de ser ponto de encontro de amantes. Segundo relatos históricos, no prédio do fim do século XIX, funcionou o Hotel Paris e, depois, o Hotel Stumbo. Com a má-fama do local, a família Parolin, proprietária do imóvel, decidiu alugá-lo para Victoria Johnscher, que promoveu uma verdadeira transformação no local, após uma grande reforma. Ela permaneceu na gerência do hotel até 1923.


Inovações

A família Johnscher havia sido proprietária de uma pensão, em Paranaguá, e com a experiência que teve por lá a viúva Victoria tornou o novo hotel em um ambiente refinado, elegante e luxuoso, por décadas, considerado um dos melhores de Curitiba. O empreendimento foi um dos primeiros a ofertar aos hóspedes telefonia interna, elevador, banheiros privativos, água corrente e quente em todos os quartos, além de ambientes bem ventilados. O hotel, em estilo neoclássico, com fachada eclética, pé direito de 5,8m e três andares, contava à época, conforme acervo do Patrimônio Histórico - IPPUC, com “setenta quartos, dez apartamentos com sala de recepção, dormitório, toalete, um amplo salão de refeições que abrigava até noventa pessoas e um lobby luxuoso”. Hoje, este número foi reduzido a 24 distintas e exclusivas acomodações.

O Johnscher era local escolhido pelas famílias curitibanas para as festas natalinas, onde era servida uma tradicional e disputada ceia, também era montada uma árvore de Natal de três metros de altura em frente ao hotel e uma orquestra era responsável por executar as canções típicas do período.

O hotel era responsável por promover festejos, como a comemoração do primeiro centenário da independência do Brasil, no Grande Diner Concert. A madame Marjolaine, sempre que chegava de Paris, anunciava em jornais que trazia “um lindo sortimento de vestidos, manteaux e chapéos de inverno que ella vendia com preços razoáveis”. Em 1930, as pessoas interessadas deveriam procurá-la no quarto 32 do Hotel Johnscher.


Anúncio publicado no jornal Diário da Tarde, de 1930
Acervo da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional


Ainda de acordo com documentos do IPPUC, “os hóspedes dispunham da melhor cozinha do sul do país à época e, ao jantar, contavam com música orquestral interpretada por um grupo contratado pelo próprio hotel. Quando deixavam a cidade, os hóspedes seguiam para a Estação Ferroviária em um ônibus que o hotel mantinha exclusivamente para este fim”.

De acordo com trabalho histórico de Marcelo Sutil e Leandro Cezar Martins, Francisco Lourenço Johnscher esteve à frente da administração do hotel de 1923 a 1929, quando passou a cuidar do outro empreendimento da família,  o Grande Hotel Moderno e o Johnscher, desde então, foi administrado por Leopoldo Niemeyer, até 1970.


Via cosmopolita

De costas para o estado religioso, de olhos para o futuro e para todo o avanço que poderia chegar pela estação ferroviária, a estátua do Barão do Rio Branco – inaugurada em 1914 e localizada na Praça Generoso Marques, em Curitiba – já dava indícios da importância política da antiga Rua da Liberdade, atual Rua Barão do Rio Branco. 

O caminho de 800 metros ligava as sedes dos poderes municipais, do legislativo e do governo estadual. Era trajeto e entrada de viajantes que desembarcavam na capital, de homens de poder, de hotéis, de diversificado comércio e de residências particulares. Ali também eram realizados desfiles cívicos, além de cortejos para homenagear políticos, celebridades e datas cívicas.

De charretes, bondes e pedestres, a rua sofreu diversas alterações de sentido e de tráfego. De acordo com a publicação Trilhas da Cidade da Gente, da Fundação Cultural de Curitiba, de 1970 a 1995 a rua tornou-se via do ônibus expresso. “Revitalizada em 1980, ganhou floreiras, novo paisagismo e postes com luminárias originais em ferro. Desde 1995 deixou de ser rota dos ônibus e foi devolvida para o tráfego de automóveis”, destaca o texto.

Com as alterações que a rua sofreu, a atual numeração do Hotel Johnscher é a de número 354.


Abandono

Com a mudança das sedes dos governos para o Centro Cívico de Curitiba, a Rua Barão do Rio Branco foi perdendo a importância, o movimento e o interesse comercial. Em 1975 o Hotel Johnscher encerrou suas atividades. Abandonado desde então, a família Parolin Coelho doou o imóvel à Prefeitura de Curitiba, em 1995, em troca de potencial construtivo. No total, o prédio ficou abandonado por 27 anos.


Hotel Johnscher abandonado 

Antigo espaço do restaurante antes da reforma

Hotel abandonado


Chegou-se a cogitar a transformação do antigo hotel em uma Escola de Hotelaria Gastronômica de Curitiba, que seria viabilizada por intermédio de uma parceria entre o município de Curitiba e a Comissão de Turismo Alemanha-Brasil. O projeto não foi concretizado. 

Com a aplicação do Plano de Revitalização do Eixo Barão-Riachuelo, na primeira gestão do prefeito Cassio Taniguchi, foi realizada a concessão de uso por 35 anos para a exploração comercial, possível por meio de licitação pública. “O empresário João Cezar Belloni, do grupo San Juan Hotéis, acreditou que o investimento era um bom negócio e aceitou o desafio. Venceu a concorrência e deu início ao processo de restauro, contratando a empresa Planotel Empreendimentos Hoteleiros e o arquiteto Humberto Fogassa de Medeiros para viabilizar o empreendimento”, destacava em documento de 2002, o então coordenador do Projeto Eixo Barão-Riachuelo, Ariel Stelle.


Nova história

Com foco no turismo de experiência, o novo Hotel Johnscher, reinaugurado há 20 anos, em 8 de outubro de 2002, oferta serviços com o intuito de despertar emoções únicas nos seus hóspedes e visitantes, proporcionando momentos de prazer, criando memórias e desenvolvendo uma relação emocional dos clientes com o hotel, trazendo à tona o conforto, hospitalidade e diferenciais pelos quais o hotel ficou conhecido. “A localização privilegiada permite aos nossos hóspedes uma experiência única, uma imersão histórica e cultural. Tudo isso combinado ao charme, grandeza histórica e tecnológica do hotel e, claro, nosso serviço excepcional’, destaca a sócia administrativa da Rede San Juan Hotéis, Claudia Belloni.


Claudia Beloni


Para despertar essas emoções, o hotel promove um mergulho na história, trazendo galerias de fotos das décadas iniciais do século XX, personagens que marcaram o período, como a homenagem a Alberto Santos Dumont – figura essencial para que o Parque Nacional do Iguaçu fosse criado em 1939, nos após sua vinda ao Paraná, em  maio de 1916. Na academia, uma ilustração baseada em uma foto real, de uma sala de exercícios da década de 1920 e suas peculiaridades, como os diferentes aparelhos e as vestimentas utilizadas.


Telefone Magneto de Parede, modelo 317 – fabricado de 1911 a 1915


O hotel ainda conta com itens originais do início do século XX, como o telefone Magneto de Parede, modelo 317 – fabricado de 1911 a 1915, nos Estados Unidos –, poltrona namoradeira estilo Luis XV, vitrola, lustre de vidro, piso de ladrilho hidráulico, identificação da numeração dos quartos em porcelana pintada à mão, máquina de costura Singer e piano Schneider, entre outros.  Uma relíquia é guardada a sete chaves: a antiga caixa de fósforos personalizada do hotel data da década de 1950 – época em que ainda era permitido o uso de cigarros em locais fechados.


Itens originais do início do século XX



Diferenciais

Todos os 24 quartos são decorados com mobiliários de época, as suítes possuem banheiras de imersão, pisos em madeira maciça. No terceiro  e último andar do prédio, apenas duas únicas acomodações: as suítes master e nupcial, garantem silêncio e privacidade aos hóspedes. Aliás, todo o hotel é disputado por noivas para a realização de sessão de fotos nas suas dependências, day use, noites românticas e de núpcias. No primeiro fim de semana de outubro, o hotel prestou atendimento a seis noivas.






No Johnscher também é possível realizar diferentes tipos de eventos no Salão do Barão – um espaço de 100m2 e que comporta até 120 pessoas. O Bistrô Zucker, aberto a hóspedes e visitantes, serve almoços e jantares diariamente e permanece aberto das 11h às 22h.

Atual Bistrô Zucker


Em 2014, o hotel foi escolhido como “Acomodação Oficial da FIFA” durante os jogos da Copa, realizados no Brasil.

Questionada sobre qual o diferencial do hotel, Claudia Belloni é enfática: “o grande diferencial do Johnscher é o próprio Johnscher. Ele é único”.







Caixa de fósforo personalizada da década de 1950

Ladrilho hidráulico restaurado

Revista Fecomércio PR - nº 150
Texto: Silvia Bocchese de Lima
Fotos: Ivo Lima

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Pedagoga do Café

Vozes para Anita