Literatura repleta de Brasil
Vinte e duas cidades paranaenses receberam de 12 a 17 de setembro a 35ª
edição da Semana Literária Sesc PR e Feira do Livro – um dos maiores eventos de
literatura do país. Renomados escritores percorreram o Paraná, durante uma
semana, para discutir como o Brasil é representado na literatura. O público adquiriu
mais de 32 mil exemplares de livros
Rica em ícones, mitos, símbolos e
com identidade própria, a cultura brasileira é, ao mesmo tempo única e plural. Revela
os costumes, as crenças e hábitos de um povo e, por meio da literatura, terreno
fértil para sua manifestação em múltiplas formas e olhares.
Para debater o tema “O Brasil na
minha obra” em um dos maiores eventos literários do país, o Sesc PR realizou simultaneamente
em 22 cidades paranaenses a 35ª Semana Literária Sesc PR e Feira do Livro, reunindo
diferentes públicos para debates e encontros com autores nacionais e
internacionais. A edição de 2016 promoveu reflexões sobre as maneiras como um
país de dimensões continentais é visto e retratado na ficção contemporânea e
lançou um olhar sobre a arte paranaense.
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Letícia Wierzchowski |
A curadoria, formada por colaboradores
do Sesc de todo o Paraná, selecionou escritores e pensou a programação com
mesas-redondas, palestras, bate-papos, sessões de autógrafo, oficinas
literárias, narração de histórias, além de apresentações teatrais, musicais e
de dança, exposições e troca de livros, gerando em uma semana mais de 254 mil
atendimentos em todo o Paraná.
Em Curitiba, na Praça Santos
Andrade, em frente à Universidade Federal do Paraná, foram recebidos os
escritores Letícia Wierzchowski, Miguel Sanches Neto, Glória Kirinus, Marcia
Tiburi, Marina Colasanti, Ana Paula Maia, Raphael Montes, Stela Maris Rezende,
Beto Silva, entre outros. Pelo interior do estado, o público teve contato com
os escritores José Castello, Oscar Nakasato, Cintia Moscovich, Marcos Peres,
Luci Collin, João Anzanello Carrascoza, Karen Debertólis, Cadão Volpato, Marta
Barcellos e Luiz Felipe Leprevost.
País multicultural
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiMY12Eiu4EhN3lCopW8AK-zwdUvPEQ0EX9Ybhl-wsNmRN3x8ZZmSbSxs_Gmcc9uZ3uf-hL3fS6gFbOPDXIzm6gVhkiYJqt9oAWENTCopkw2AIszhDB-SOepxTQUwjwnKdWqVUw4wAa1xs/s400/_BTR4376-2.jpg)
Neta de imigrantes poloneses, a
escritora gaúcha Letícia Wierzchowski, conhecida em todo o país pela obra A Casa das Sete Mulheres, revelou a
relação que tem com a cultura polonesa e sobre a história familiar. Quando
descobriu cartas do avô, decidiu escrever três romances contando a imigração
polonesa: Uma ponte para Terebin; Os Getka e, Cristal Polonês. “A minha relação com esta cultura foi sempre muito
divertida. Foi o berço onde nasci e cresci. Em meus livros conto a vida dessas
pessoas que vieram da Europa para o Brasil e misturaram seu sangue, suas
heranças, suas sabedorias com as nossas”, conta.
Letícia relatou a história do avô
que veio da Polônia em 1936, lutou na 2ª Guerra Mundial, libertou um campo de
concentração e constituiu uma empresa em Porto Alegre. “Falo aqui dos
imigrantes, desta gente de além das fronteiras, além mar, que veio aqui dar o
seu sangue. Somos, principalmente no sul, uma mistura de raças. Isso me
interessa demais, é rico em histórias e, um escritor vive atrás disso, de
histórias”.
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Programação para todas as idades |
Foi por meio do rádio, em uma
transmissão de futebol, que a escritora peruana Glória Kirinus teve o primeiro
contato com a língua portuguesa. “Encantou-me ouvir aquele idioma tão parecido
com o meu, mas com uma sonoridade tão distinta e que hoje, está em mim. A
leitura permite ao leitor e permitiu a mim, um passaporte poético. Nós adultos
perdemos a curiosidade quando perdemos a vitalidade poética. A poesia serve
para me vitalizar. A poesia e a literatura me permitem respirar melhor!",
conta Glória.
Marina Colasanti, escritora
etíope, com quase 60 livros publicados no Brasil e no exterior, emocionou o
público da capital paranaense ao relatar a sua experiência com a literatura e a
trajetória que percorreu durante a 2ª Guerra Mundial, até chegar ao Brasil, em
1948. “Mesmo no meio de uma guerra, a Europa não perdeu a cultura da leitura.
Durante todas as mudanças que vivemos, não levávamos nada além de um anel de
diamantes que minha mãe tinha costurado na barra da saia para ser usado em
alguma emergência. Não tínhamos brinquedos, nem brincávamos na rua. Meus pais
contavam histórias para mim e meu irmão. Até que nos presentearam com uma
coleção de livros clássicos da literatura. Acredito que ninguém tem bom texto à
toa, é preciso leitura”, pontua Marina.
Marina avalia que o Brasil é
formado por muitos países emendados em um só e desabafa com a falta de interesse
e de acesso à cultura. “Vivemos em um país onde a crítica literária morreu,
onde nem todos os leitores lerão literatura, embora ainda leitores.
Infelizmente nosso país não considera a literatura relevante e não se esforça
para implementar o acesso à ela”, diz Marina.
Brasilidade
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Ana Paula Maia |
Carioca de Nova Iguaçu, foi em
Curitiba que a escritora Ana Paula Maia decidiu fixar residência há quase dois
anos. Escritora de seis títulos, com histórias sequenciais que por vezes
avançam ou recuam no tempo, Ana Paula revela o desejo de ambientar uma de suas
obras em terras paranaenses.
Nessas terras, ricas em
linguagens próprias, o ponta-grossense Miguel Sanches Neto, encontrou a si
mesmo em suas obras. “Um romance nos localiza, pela linguagem, em determinados
grupos sociais, em determinada visão de país. Minha literatura de ficção é uma
forma de apreender meu país como linguagem. Antes de ser um tema, o Brasil
entra em meus livros pela adesão a um discurso conjugado de forma aberta, que
possa ser compreensível por um maior número de pessoas. Só depois ele trata de
episódios da vida social e política do país. Qualquer livro autenticamente
literário que se leia tem uma informação identitária implícita na própria
linguagem”, enfatiza.
Identidade tem a ver com
autenticidade para a escritora mineira Stela Maris Rezende. Ela conta que a
riqueza linguística encontrada no Brasil não pode ser deixada de lado pela
literatura. Autora de mais de 50 livros
de romances, novelas, contos, crônicas e poemas, Stella tem 33 anos de carreira
e coleciona quatro prêmios Jabuti, três prêmios João-de-Barro, entre outros.
“Nunca abri mão da minha linguagem mineira e, ao escrever, converso com tudo
aquilo que já foi escrito. O linguajar mineiro perpassa toda a minha obra, é a
minha identidade, meu projeto estético. Sempre fui apaixonada pela diversidade
da fala no Brasil e se a literatura não dialogar com a complexidade do ser
humano, ela não é arte!”, avalia Stela.
Para a doutora em Filosofia e
escritora Marcia Tiburi, a variedade de discursos consolida e até mesmo cria
uma identidade nacional. “Desde a Ilíada
e a Odisseia, a literatura é uma
espécie de máquina de produzir e reproduzir visões de mundo. Como instituição,
a literatura é tão conservadora quando revolucionária. Depende do sujeito que a
toma para si como uma prática, se ele está ou não de acordo com o status quo. A
literatura é atravessada pela sociedade tal como ela se apresenta em seus
conflitos e desejos no tempo em que a literatura é feita. O escritor é uma
antena da sociedade onde vive”, acredita.
Números registrados durante a Semana Literária Sesc PR em todo o
estado:
Atendimentos: 254 mil
Livros comercializados: 32 mil
exemplares
Livrarias participante: 63
Escolas participantes: 575
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A Lenda das Cataratas, apresentada por Curitiba Cia. de Dança |
Lenda Paranaense
A apresentação A Lenda das Cataratas pela Curitiba Cia.
De Dança fez parte da programação da Semana Literária, em Curitiba. O
espetáculo de dança contemporânea teve como inspiração a lenda indígena que
conta a formação das Cataratas do Iguaçu.
Segundo a lenda, era nas margens
do Rio Iguaçu que habitavam os índios Caigangues. Este povo acreditava que o
M´Boy, um deus em forma de serpente, filho de Tupã, governava o mundo. O
cacique da tribo, Igobi, era pai de Naipi, uma índia de beleza ímpar, que ao
mirar-se nas águas do rio fazia com que elas parassem.
A índia foi consagrada ao deus
M´Boy e deveria viver somente para prestar culto a ela. Um jovem guerreiro da
tribo dos Caigangues chamado Tarobá, ao ver Naipi, apaixonou-se por ela.
Na festa de consagração da índia,
Tarobá fugiu com Naipi em uma canoa rio abaixo, arrastada pela correnteza.
Quando M'Boy percebeu a fuga de
Naipi e Tarobá, ficou furioso. Penetrou então as entranhas da terra e,
retorcendo o seu corpo, produziu uma enorme fenda, onde se formou a gigantesca
catarata.
Envolvidos pelas águas, a canoa e
os fugitivos caíram de grande altura, desaparecendo para sempre. Diz a lenda
que Naipi foi transformada em uma das rochas centrais das cataratas,
perpetuamente fustigada pelas águas revoltas.
Tarobá foi convertido em uma
palmeira situada à beira de um abismo, inclinada sobre a garganta do rio.
Debaixo dessa palmeira acha-se a entrada de uma gruta sob a Garganta do Diabo
onde o monstro vingativo vigia eternamente as duas vítimas.
Fonte: Cataratas do Iguaçu S.A.
Texto: Silvia Bocchese de Lima
Fotos: Bruno Tadashi e Ivo Lima
Revista Fecomércio PR - nº 114
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