Pimenta, caçarola e bons negócios



Nunca o brasileiro comeu tanto fora de casa e, apesar disso, descobriu o prazer de cozinhar e o mundo dos temperos. O mercado das especiarias está em alta no Paraná, a cesta de compras repleta de aromas e sabores


Por elas, guerras já foram travadas; o bíblico José chegou a ser vendido pelos irmãos a um grupo que as comercializava e, rotas comerciais abertas para buscá-las em terras longínquas. As especiarias, indispensáveis na gastronomia, já foram vendidas a preço de ouro e hoje reconquistam espaço e o gosto de chefs e cozinheiros eventuais.
Apesar da facilidade em se consumir alimentos fora de casa e da variedade de restaurantes que ofertam uma gama de opções gastronômicas, o brasileiro tem desvendado o prazer de cozinhar em casa.
Para o sócio-proprietário da Bombay Food Service Ltda., Nelusko Linguanotto Neto, o Nelo, o Brasil está redescobrindo o mundo dos temperos. “Nós fomos descobertos pelas especiarias. Foram por conta delas que espanhóis e portugueses rodaram o mundo. Agora, novamente o país está sendo invadido por temperos e estamos misturando-os a nossa cultura, nossas raízes, nossa culinária e sabores”, pontua Nelo.

Culinária relacional
O empreendimento que começou em São Paulo, já se espalhou por todo o país, com lojas também em Curitiba. Na avaliação de Nelo, a Bombay entrou no mercado justamente no momento em que o consumidor começou a se interessar ainda mais pelo assunto. “As pessoas gostam de comer fora de casa, mas está cada vez mais caro fazer isso e elas estão aprendendo a cozinhar; chamar amigos para comer em casa tornou-se um hobby. É barato, simpático e muito mais prazeroso”, avalia.
Márcio Hidalgo, servidor público e analista de sistemas, sempre teve interesse pela gastronomia, e há poucos dias realizou um curso rápido para aprender a preparar um prato à base de camarões. “Leio blogs, assisto a programas de TV que tratam do assunto. Eu já cozinhava o trivial, mas aperfeiçoando as técnicas da gastronomia, tenho o intuito de receber meus amigos em casa e cozinhar para eles”, revela o analista.
Para o antropólogo Roberto DaMatta, tem-se no Brasil a chamada “culinária relacional”: o brasileiro tem o hábito de trazer à mesa aquele que considera próximo. “À mesa, o brasileiro congrega liberdade, respeito e satisfação. Na mesa, realmente, e através da comida comum, comungamos uns com os outros num ato festivo e certamente sagrado. Ato que celebra as nossas relações mais que nossas individualidades. Daí por que ligamos intensamente a comida com os amigos”, enfatiza DaMatta.

Mercado em crescimento
O sal ganhou novo status nas prateleiras de empórios e uma abundância de opções está disponível aos consumidores. Não se trata apenas do sal marinho ou temperado, mas o passeio gastronômico vai do sal rosa do Himalaia ao negro ou cítrico, passando pela flor de sal e pelo havaiano.
E a diversidade de produtos não para por aí. Só a Bombay conta com um mix de 270 tipos de ervas e especiarias e 60 variedades de pimentas. O crescimento anual das vendas da empresa gira em torno de 30%. “A maioria dos produtos, mais de 80% das especiarias consumidas no Brasil são importadas, e o interessante é que elas vêm dos mesmos lugares de onde vinham há mais de 500 anos”, diz Nelo.
Programas de gastronomia; a facilidade de se viajar e conhecer outras culturas; a realização de festivais gastronômicos e a vinda de chefs internacionais ao país têm influenciado o gosto e o paladar do brasileiro. “O hábito de se utilizar temperos e ervas tem crescido por diversos motivos e não se trata apenas de uma tendência nacional, mas mundial”, avalia.
Sempre que vem ao Paraná, a catarinense Salete Sakae visita o Mercado Municipal de Curitiba em busca de novos temperos e conta que sua experiência com a gastronomia teve início na infância, aos nove anos de idade. Hoje, com a filha fazendo doutorado em Paris, as visitas ao exterior tornaram-se mais frequentes e os sabores que ela prova lá quer repetir na cozinha brasileira.
A dona de casa Cleia Brandt de Moura descobriu as especiarias quando o marido precisou reduzir o consumo de sal. “Sempre utilizei nos pratos que preparo ervas e temperos para dar um toque especial no alimento. A cozinha é uma alquimia, precisamos inventar. E para cuidar da saúde do meu marido, substitui o sal por ervas e acabei acrescentando sabor e aroma aos pratos”, revela Cleia.
O empresário destaca que a Bombay está iniciando o processo de exportação, com uma linha de produtos que tem como foco as pimentas. “Temos uma variedade imensa de pimentas no Brasil e há espaço para elas mercado internacional, principalmente porque há espécies aqui que não são encontradas em outros lugares do mundo”, revela Nelo.

Novos investimentos
Em dezembro do ano passado, Helbert Frantz Yamada resolveu investir no mercado de temperos e inaugurou a Temperamento, no Mercado Municipal de Curitiba, uma loja especializada no ramo, comercializando 80 opções de condimentos e uma variedade de vinagres e azeites com baixa acidez. Yamada salienta que para realizar o investimento realizou um estudo mercadológico, mas revela que para se dar bem neste ramo não pode haver falta de dedicação, paciência e diálogo com o consumidor. “O mais gratificante neste mercado é ver o cliente retornar à loja e dizer: ‘como ficou ótimo o tempero que você nos indicou”, diz.

Espaço gourmet
A culinária brasileira também é reflexo do espaço destinado para prepará-la. A cozinha já foi o ambiente nobre da casa, com grandes mesas e reunião familiar. De repente, tornou-se o lugar onde a empregada doméstica cozinhava para a família, um espaço pequeno e de pouca movimentação. Hoje, a cozinha conquistou uma nova posição nas construções e em empreendimentos, desfrutando de uma denominação contemporânea: espaço gourmet. “A embalagem do tempero fica exposta, acaba compondo o ambiente da cozinha gourmet, que é uma tendência hoje. Por isso nosso cuidado com a qualidade do produto e com o visual, afinal, uma embalagem bonita e um bom produto são fundamentais”, revela Nelo.

Utensílios
Há bem pouco tempo não se tinha o hábito de presentear com panelas, a não ser em ocasiões como o casamento. Mas a quantidade de produtos, cores, formas e materiais tornaram o utensílio de fogão utilizado para o cozimento em um objeto de desejo, como é o caso das caçarolas, que facilmente chegam a custar perto dos R$ 1 mil.
Kits de ervas e temperos são novas opções para quem quer presentear e ser presenteado.


Texto: Silvia Bocchese de Lima
Revista Fecomércio PR nº 98

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